segunda-feira, 29 de março de 2010

Proteção legal a docentes contra violência em sala de aula evidencia fracasso pedagógico, diz especialista -

                                                                       
 Em resposta à recorrência de casos de agressão contra professores nas escolas, diversos projetos de lei têm sido apresentados no Congresso. Um deles, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), foi aprovado em novembro pela Comissão de Educação do Senado. O projeto de lei 191/09 classifica como violência contra o professor "qualquer ação ou omissão decorrente da relação de educação que lhe cause morte, lesão corporal ou dano patrimonial, praticada direta ou indiretamente por aluno, seus pais, responsável legal ou terceiros, face ao exercício de sua profissão". De acordo com Paim, a ideia é disciplinar uma série de condutas e estabelecer o encaminhamento dos casos. "É preciso que se instale um mínimo de disciplina e esse projeto vem nesse sentido", afirma Paim.


Em outro projeto de lei (178/09), Paim propõe que o professorado dedique um terço do número de aulas/hora para interagir com famílias e alunos, a partir da cultura de paz nas escolas. "Hoje não existe nada e há insegurança. Esses dois projetos devem dar respaldo para que o professorado se sinta mais seguro. Objetivo é tentar inibir violência contra professores" , completou.

Sobre o tema, o Observatório da Educação entrevistou dois especialistas: o advogado da Apeoesp, César Pimentel, e o pesquisador do Núcleo de Estudos da violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP), Renato Alves.
Para Renato Alves, a proposta de criminalização das condutas violentas em sala de aula pouco contribui para resolver os problemas que se apresentam no cotidiano escolar. O pesquisador lembra que criminalizar não necessariamente diminui o comportamento agressivo ou violento, pois o cálculo de quem pratica o ato não é racional: não se faz, antes de cometer um ato violento, uma medição das possíveis consequências. "Não vejo como uma lei teria força sem trazer o tema da violência de forma transversal, como parte da formação escolar. É preciso começar a trabalhar isso desde os ciclos mais básicos. A lei seria uma força para coibir algo que é resultado do que não foi ensinado. A criminalização aponta o fracasso da educação, do que não se constituiu isso como um princípio via educação. Só ter a lei é continuar no fracasso", aponta.

O pesquisador ressalta ainda que as relações dentro da escola são, muitas vezes, extremamente autoritárias, e isso influencia na relação entre professor e aluno. "Querem que o mesmo professor, que no seu dia-a-dia não é ouvido nem bem tratado, seja democrático em sala de aula. A relação professor – aluno é contaminada por essa violência institucional, porque esse trabalhador sofre dentro da própria instituição", diz Alves. Para ele, as relações institucionais, hierárquicas, são muitas vezes violentas, além de o professorado não ter qualquer espaço na construção de políticas educacionais. "Elas vêm de cima pra baixo e os professores têm de aceitar. Esses tipos de ação, que passam pelas hierarquias, vão estourar no ponto mais fraco, que é a relação entre professor e aluno", complementa.

Já para Pimentel, apesar de o código penal apresentar mecanismos para coibir e encaminhar casos de violência em sala de aula, a tipificação possibilita melhor acompanhamento dos casos. "O projeto responde a uma necessidade que existe, pois esses casos de violência contra professores tomaram uma proporção que não se via há pouco tempo. Há, por conta disso, uma necessidade, pelo menos pedagógica ou psicológica, de tipificar essa norma com mais clareza", destaca.

Além disso, Pimentel considera um avanço a proposta de medidas acautelares (que são tomadas no início do processo) presentes no projeto de lei. "A lei tem esses dois méritos: reúne procedimentos que a política e o Judiciário poderiam tomar sem a existência dela, e passa a servir de receita. O segundo mérito é dar possibilidades de medidas acautelatórias. É uma novidade que hoje não está prevista e que pode ser feita a partir da lei".

O projeto de lei de Paulo Paim segue a tramitação no Senado. Agora, será apreciado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Casa.

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